quarta-feira, 18 de outubro de 2006

Listel em cordel.

Caminhando pelo campo de flores.
Driblar bares que pagam comissão à guias turísticos.
Comprar roupa no quilo na Rering e pagar pelo grama.
Três por vinte.
Não é Rering, é SarDInha.
O chapéu não está à venda.
Pense pelo lado positivo, ao menos fará regime esta noite.
Ciclone.
Liquidificador que sai do mar.
Culpa das pessoas que desmatam mangues.
Não seria a Nau do homem azul?
Um barril de chope é muito pouco para nós.
Os pássaros migram pra onde?
Brindo La Vida!
Não, não bebo chope.
Mas dois barris de chope é muito pouco para nós.
Barriga verde.
Cuia para chimarrão.
Sem mate.
Molho para cachorro quente com repolho.
Salete.
Orkoba.
Orkioba..
Orôba...
Orôber...
Orktuba....
Oktorober?
Três barris de chope é muito pouco pra nós.
Tem luz negra.
Slep. Slup.
Descola tudo.
Não era luz negra, era uma lanterna.
Sushi?
Saquê?
"Ei! Duvido que você a beije novamente!"
Dança gordinho, dança.
"A guria é argentina!"
Quatro barris de chope é muito pouco pra nós.
"yo tengo noivo."
Chope de trigo com cheiro de pão.
"Cátia, La Catcha...
La Catcha...
La Catcha"
Piscina ou sauna?
De que cor é seu Pititichim?
Orkobora?
Ta um leão!
Quem bebe no beto?
Hip Hop, não.
Cinco barris de chope é muito pouco pra nós.
Fuli fuli, fuli fulá, fuli fuli fuli fulá...
Dança da moradia.
Corre tartaruga, corre.
E a Opera de Arame toca.
Fuli fuli, fuli fulá, fuli fuli fuli fulá...
E ressona...
Seis barris de chope é muito pouco pra nós.
A árvore da montanha olê a í a ô.
Encontraram em Ice quente o catalisador das emoções.
A lua era cheia.
Labirintite com teleférico.
X-man versão argentina.
Como comer areia surfando.
Dança, dança com o velhinho. Um real? Um real?
O açougueiro do labirinto do terror era o galã.
Quem dá um giro na árvore da cidade do Floriano Peixoto?
Ninguém quer fazer city-tour.
Querem seqüências de camarão.
"Hola chica, a cá."
Pânico no hotel.
Sete barris de chope é muito pouco pra nós.
Pânico?
Desmaio, processo, polícia.
Turbulência no ônibus.
Ravier.
"Coloca Lost!"
Opa!
Afundou a perna.
É um mangue ou o fundo do casco do navio?
Tira foto.
Com minha máquina também.
Tira outra.
"Hola chica, a cá!"
Oito barris de chope é muito pouco pra nós.
Vou levar...
Um licor.
Três cachaças de banana.
Uma caneca tamanho balde para chope.
Um broche para chapéu.
Essa bermuda florida.
Um argentino.
Salete é minha amiga.
Macarrão Vilma?
Nove barris de chope é muito pouco pra nós.
Tem alguma balada latina pra essa noite?
Alguém troca meu niilismo por um milho cozido?
Qual a raiz cúbica do logaritmo de 256?
Araucária.
Um real! Um real! Um real para descer no prrrrrrrl.
É de cana caiana.
É de bucha bochecha.
Dez barris de chope é pouco pra nós.
"O amor me pegou..."
Eu não descanso enquanto não faltar 45 dias para o vestibular.
"Saiu na noite a procura..."
Fuli, fuli, fuli, fula, fuli, fuli, fuli, fulá...
"O meu amigo oculto se veste peculiarmente"
Orkutbar?
Onze barris de chope é muito pouco pra nós...
De quem é a canga?
Como falar espanhol pigarreando.
Blusa vira saia.
Noite vira dia.
Tem gente que vira tequila.
Gente que toma chope no metro.
Doze barris de chope é pouco pra nós...
No ônibus tem um arco íris.
No maior restaurante da América latina tem uma loja de artesanato.
Minha identidade secreta é um palmito.
Agora, com licença, tem um café ali, vou perguntar...
Esconde o pandeiro.
Queimei a mão no chuveiro.
Onde tem uma balada boa que não seja samba e pagode?
Treze barris de chope é muito pouco pra nós...
Corre tartaruga! Corre!
Onde se compra uma licença poética?

segunda-feira, 18 de setembro de 2006

Continua o meu fadário de perguntar-me o que sou eu ou porque sou como sou. Continua a sina de refletir incansavelmente sobre alguma coisa.
Como ao encontrar um endereço a mais, no histórico do computador de alguém, pensar: ¿isso não deverias estar aqui¿ e perder o sono indagando: ¿Será que ela sabe? Será que ela sabe? Será que ela sabe?....¿ E se ela soubesse, o que demais saberia?

E o mendigo diz enquanto fita o céu:
- Afinal, não me hás de cair em cima.
E o céu:
- Nem tu me hás de escalar.


Quantas vezes eu mesma não disse que Machado era Deus?
Quantas vezes eu não expliquei, a quem me interpelasse a respeito, que meu ateísmo não se resumia à incredulidade, mas à descrença na limitação imposta pelas religiões e à mania do ser humano dar nome às coisas?!
Na última sexta-feira o professor de Literatura (sim, aquele perfeito, com o qual alguém disse que casaria) repetiu o mesmo discurso de todos os admiradores do Vosso Excelentíssimo Senhor Machado de Assis. Disse que ele era como um deus em suas histórias, e não dava ponto sem nó. O que é o caso do mendigo, senão uma prévia do destino de Rubião? O que é a Opera, em Dom Casmurro, se não uma referência à Otelo que deu fim à vida da pobre Desdémona sintetizando a própria história de Bentinho?
Aos excessivamente religiosos deixo uma blasfêmia: Machado era o messias, o prometido, e não soubemos enxergar!
Exageros à parte, o que é cada fato de nossas vidas ¿ corriqueiro ou singular ¿ senão uma síntese de todo o resto. Uma pista do inexplicável? Sabe-se lá.
(Sobretudo sejamos científicos) Existe ainda coisa que não possamos explicar?
Quando vê, encontra-se em meio a um breume danado quebrado apenas por um abajur com estampas em preto e branco. A conversa segue aos sussurros, sabe-se lá por que. Estabelece-se aquele papo aranha - é o efeito do álcool, provavelmente ¿ fala-se de um tudo, mas, sobretudo, fala-se do que há de mais interessante nesse mundo. Fala-se das pessoas. Fala-se indiretamente nelas enquanto fala-se de si mesmo.
Pode imaginar, ao ler o parágrafo anterior, que falar das pessoas é o mesmo que sentar para fofocar. Engana-se se pensa isso. Há muito mais por trás das pessoas do que um simples homem ou mulher, ou um objeto de curiosidade.
Passado o ímpeto a classificar-me como um ser frívolo, me chamará hippie. Não discursarei contra isso. Tomar-me-á tempo. Avante.
Penso que quando duas pessoas se reúnem para prosear podem ocorrer duas coisas. Uma é que a conversa será uma qualquer e algum dia encontrará o esquecimento; a outra é que, por mais estranha que possa ser, ficará involuntariamente incrustada na memória.
Não é como quando acontece alguma coisa de especial. Um primeiro beijo, por exemplo. Você chega em casa, nas nuvens, e o seu único desejo é nunca na vida esquecer aquele momento.
Muita presunção acreditar que realmente nunca esquecerá. Eu poderia dizer que as sensações nunca são esquecidas (desconfio até que já o disse, aqui, algum dia), mas o que lembro eu, agora, daquele três de setembro (dois anos atrás) que jurei nunca esquecer? Lembro da ansiedade. Do temor. Lembro que me assentei no banco de um 4032 qualquer (eu me sentia nas nuvens) e jurei que nunca esqueceria nada daquele momento. Vês? Neste momento eu mal relembro da garota que repetia, horas antes, traquinamente ¿Julia! Três de setembro! Guarde esta data!¿
Eu não me lembro dos diálogos ocorridos no dia da pipoca. Mas eu me lembro de quando me julgou e disse que eu era uma pessoa que se adaptava. Eu me lembro disso porque dizê-lo a mim não foi, provavelmente, tencionado. Saiu voluntariamente. Como segue pelo acaso a vida.
Talvez daí provenha aqueles dizeres, como são? As mais profundas provas de amor são as mais simples e inusitadas.



Foi uma conversa estranha. Eu acordei pensando nisso. Mas estranhamente não pensei sobre o conteúdo. Pensar sobre o conteúdo seria teorizar sobre ele e teorizar é poder cair em impugnação que, por sua vez, é entregar a matéria a um futuro esquecimento.
Então, um rapaz que eu provavelmente nunca conhecerei pessoalmente fala-me sobre Platão. Ele diz que Platão inventou o céu antes que este existisse.
- Quer ver um exemplo?- ele me pergunta. ¿ Qual a sua cor predileta?
- Vermelho.
- Por quê?
Encarei a tela do computador por alguns instantes. Ecoava por minha cabeça a pergunta: ¿Por quê?¿. Escapou-me um sorriso demente e uma confissão íntima. Eu não sei. Eu poderia tentar explicar que é uma cor intensa e que talvez eu seja uma pessoa intensa. Mas o que são as definições que damos às coisas senão pura presunção?
- Eu não sei. ¿ Respondi tão francamente como eu poderia.
- Vê? ¿ Disse-me. ¿ Isso prova que a sua vida não começa exatamente quando você nasce. Você vem pra terra com um conhecimento empírico que não tem acesso à resposta. Isto prova que viemos de algum lugar.
Não é necessário que você pare por um segundo e se pergunte: Mas ela não era atéia? Sim, mas este ateísmo provém muito mais da falta de crenças do que da própria descrença, como me lembro ter explicado no começo deste.
Fato é que não compreendo porque acredito em monogamias em meio a tantas pessoas que acreditam no desuso desta. (E assim foi até que encontrei pessoas que inexplicavelmente acreditavam no exato contrário disto) E também não há uma explicação plausível para o fato de ter começado a ler tão cedo, por gostar de números e de letras ¿ ao mesmo tempo ¿ e por gostar de vermelho. Da mesma forma, o rapaz da minha conversação sobre Platão disse nunca conseguir encontrar uma explicação por sentir-se atraído por mulheres fumantes (por mais que nunca tenha, por exemplo, namorado alguma).
Mas por mais que a minha única conclusão seja algo próximo ao Caeirismo, eu continuo olhando as pessoas e admirando-as por serem simplesmente pessoas com suas características Platonistas.
No fim sempre aparecerá alguém que dirá: ¿Mas você não tem problemas em escrever o que sente¿. E eu pensarei: ¿Mas você não tem problemas com passos de dança. [expressão corporal¿, ou ¿Mas você não tem problemas em trabalhar com números de cabeça.¿ Ou ainda ¿Mas você não tem problemas em se expressar verbalmente...¿ Mas eu não o direi, pois eu penso muito além da minha capacidade de dizer, e digo muito mais do que gostaria.

Mas é que as pedras na são poetas, são pedras;
E as plantas são plantas só, e não pensadores.
Tanto posso dizer que sou superior a elas por isto, como que sou inferior.
Mas não digo isso: digo da pedra, <<é uma pedra>>,
Digo da planta, <<é uma planta>>,
Digo de mim, <>.
E não digo mais nada. Que mais há a dizer?


De repente eu me pergunto: Pra quê contar as horas? Se fecho os olhos e percebo que as sensações, e aquela leveza tão particular, todas elas, continuam aqui, tão reais a ponto de parecer que durante os quase três meses passados você esteve sempre aqui, ao meu lado. Afinal, foi você quem disse que para enganar a saudade bastava fechar os olhos. É como pó de pirimplimplim. Eu me lembro de algum dia, de algum silêncio, do seu sorriso o preenchendo. Eu não me lembro que dia foi esse. Mas foi lá que eu soube que não me deixaria mais. Foi como a felicidade, necessária para voar.

quinta-feira, 7 de setembro de 2006

Sem tempo pra escrever... continuam os textos que não são meus.

...mas nós, intelectuais, pois eu também o considero um, temos o dever de permanecer lúcidos até o fim. Já há coisas supérfluas demais no mundo, mais desordem é inútil.
[...]

Alegre-se, não há o que fazer, e ele teve o que merecia por ter entrado tão levianamente numa aventura tão pouco séria.
Não sinta saudade nem remorso. Destruir é melhor do que criar, quando não se cria o essencial.
Será que há algo tão claro e justo no mundo que mereça viver?
[...]
É melhor derrubar tudo e espalhar sal em cima, como se fazia para purificar os campos de batalha.
No fundo, só precisamos de um pouco de higiene, de limpeza, de desinfetante!
Estamos sufocados por palavras, por imagens, por sons que não têm razão de ser, que saem do nada e se dirigem para o nada!
A um artista que realmente seja digno de tal nome só se devia pedir a lealdade de educar-se para o silêncio.
Lembra do elogio de Mallarmé à página em branco? E de Rimbaud? [...]
Se não se pode ter o todo o nada é a verdadeira perfeição.
Me perdoe tantas citações, mas nós, críticos, fazemos o que podemos.A nossa verdadeira missão é varrer os milhares de abortos que todo dia tentam obscenamente vir ao mundo. E o senhor pretendia deixar atrás de si todo um filme como um aleijado deixa no chão a sua pegada disforme?
Que presunção monstruosa achar que seria útil a alguém o esquálido catálogo de seus erros! E de que adiantaria unir os farrapos da sua vida, suas vagas lembranças, os rostos daqueles que nunca soube amar?
¿O que é esta faísca de felicidade que me faz tremer, me dá forças? Desculpem, doces criaturas, eu não tinha entendido, não sabia como é justo aceitar, amar vocês, e como é simples! Luísa, sinto-me libertado. Tudo me parece bom, tudo tem um sentido, tudo é real! Como eu gostaria de saber explicar, mas não sei dizer.
Pronto, tudo está de novo como era antes, tudo está confuso. Mas esta confusão sou eu. Eu como eu sou, e não com eu queria ser, e não tenho medo de dizer a verdade, aquilo que não sei, que procuro e não achei. Só assim vivo, e posso olhar teus olhos fiéis sem sentir vergonha. A vida é uma festa, vamos vivê-la juntos. Só direi isso, Luísa, a você e aos outros. Aceite-me, se puder. Só assim poderemos tentar nos encontrar...¿

[Cena final de Fellini 8 1/2]

domingo, 13 de agosto de 2006

Um monólogo por Rei Ayanami

(Evangelion)

Montanhas, pesadas são as montanhas
Mas há mudanças
Azul, céu azul
Algo que os olhos não vêem.
Algo que se pode ver.
O sol, algo que é único.
Água, algo que é agradável.
(...)
Flores, tantas iguais, tantas sem razão de ser.
Céu.
Vermelho.
Céu vermelho.
A cor vermelha, cor que eu odeio
O líquido flui. Sangue.
Um cheiro de sangue
Uma mulher que nunca sangra.
Da terra vermelha vêm os humanos.
Humanos feitos por homem e mulher.
Cidade.
Uma criação humana.
(...)
O que são os humanos?
São criações de Deus?
Humanos são aqueles criados por humanos.
Isto é o que é meu:
Minha vida, meu coração.
Sou o vaso de meus pensamentos.
A escotilha de entrada, o trono da alma.
Quem é esta?
Esta sou eu.
Quem sou eu?
O que sou eu?
O que sou eu?
O que sou eu?
O que sou eu?
Eu sou eu.
Esse objeto sou eu
Isto que forma sou eu.
Esse é o ser que pode ser visto.
E ainda assim sente que não sou eu.
Uma sensação estranha.
Parece que meu corpo se derrete
Não posso mais me ver.
Minha forma desaparece de vista.
Aparece alguém que não sou eu.
Quem está aí?
(...)
Alguém que eu conheço?
(...)
Quem esta aí?
Quem é você?
Quem é você?
Quem é você?

quinta-feira, 3 de agosto de 2006

Pequeno ensaio sobre O Que Seria de Nós Sem as Coisas Que Não Existem

A única coisa que realmente existe é a existência.

Existimos antes de nascer, como quimera.

Existimos ao nascer, como matéria e sonho realizado.

Existimos na infância, como jóia rara e quebrável.

Existimos durante a vida, como ilustração da alomorfia.

Existimos ao perecer, como matéria morta e lembrança.

Existimos pela eternidade, como idéia.

Existimos como os restos de um chapéu que não deu certo.

Existimos até que caiamos no desuso e encontremos o esquecimento.

A princípio existe uma porção de perguntas.

O que é a existência?! O que é uma coisa?! O que é o nada?! O que somos nós?!

A existência de um dicionário da língua portuguesa torna o significado de coisa o início mais provável na busca de respostas.

Você sabe o que é coisa?

Coisa é aquilo que existe ou pode existir; um objeto inanimado; uma realidade ou um fato; um negócio ou um interesse; um empreendimento ou uma empresa; um acontecimento ou uma ocorrência; um caso, um assunto ou uma matéria; uma causa ou um motivo; um mistério ou um enigma; os órgãos sexuais sejam de animais ou plantas; um troço, uma doença, uma indisposição ou um mal estar; um baseado, uma porção de droga ou o próprio diabo; uma sensação; as posses de uma pessoa; um sentimento ou uma idéia. Coisa pode ser qualquer coisa.

Ressona tão complexo que seria digno existir a Ciência da Existência, onde a principal constante seria a relatividade. Uma ciência tão pessoal e singular quanto os pensamentos mais âmagos das pessoas. Apenas uma característica coincidiria a todos: a taxonomia maquiavelista separando as coisas que existem das coisas que não existem.

As coisas que existem são todas aquelas que passaram através do filtro do racionalismo. São tocáveis, compreensíveis, avaliáveis e de forma alguma são frutos da imaginação. São explicáveis através de números e teoremas e definidas por enciclopédias e dicionários.

As coisas que não existem se dividem entre o desconhecido, a fantasia e os paradigmas.

O desconhecido existe como o impulso à vida dos curiosos. Em certo instante da existência, o desconhecido torna-se a razão do ser, o combustível da sabedoria.

A fantasia existe como a mais chistosa forma de felicidade. A doce irrealidade a reger a vida dos sonhadores.

Os paradigmas existem para limitar e alienar a existência. Como protótipo dele, existe a utópica busca pela perfeição inexistente. Provém da crença no empirismo pautado e do massacre da liberdade do ser.

Na Ciência da Existência a única teoria comprovada seria a ausência de um limite claro e cabível entre os pólos. Assim, não existindo princípio ou fim entre o que existe e o que não existe, propor-se-ia uma nova questão intitulada O Que Seria de Nós Sem As Coisas Que Não Existem.

segunda-feira, 31 de julho de 2006

"Não sei quem você é. Por favor, acredite. Não há como convencê-lo de que isso não é mais um truque deles. Não faz mal. Eu sou eu. Não sei quem você é, mas eu te amo. Eu tenho um lápis, um pequenininho, que eles não encontraram. Eu sou uma mulher, escondi dentro de mim. Talvez não vou poder escrever de novo, por isso, esta é uma carta muito longa sobre minha vida. Vai ser a minha autobiografia e... Meu Deus, estou escrevendo em papel higiênico.
Eu nasci em Nottingham, em 1957. Chovia um bocado. Passei por um teste de avaliação e fui pra uma escola feminina: eu queria ser atriz. Lá encontrei minha primeira namorada. Seu nome era Sara. Tinha catorze anos e eu, quinze. Nós duas estudávamos com a srta. Watson. Suas mãos... suas mãos eram lindas.
Na aula de biologia, fiquei ouvindo a Sra. Hird dizer que o convívio íntimo entre meninas era uma fase adolescente, que as pessoas superam. Sara superou...
...eu não.
Em 1976, parei de fingir e levei uma namorada, Christine, para conhecer meus pais. Uma semana depois fui pra Londres, pra escola dramática. Minha mãe disse que parti o coração dela, mas minha integridade era mais importante. Isso é egoísmo? Pode não ser muito, mas é tudo que nos resta aqui. São nossos últimos centímetros, mas, neles, nós somos livres.
Londres. Eu era feliz em Londres, em 1981, interpretei Dandi em Cinderella. Meu primeiro trabalho. O mundo era estranho e conturbado, com platéias invisíveis por trás das luzes quentes. Todo aquele glamour era de perder a respiração. Era emocionante e, ao mesmo tempo, solitário. À noite, eu ia pras boates. Eu não me misturava e nem fazia amizades facilmente. Eu observava tudo, mas nunca me senti confortável. Lá havia muitos que só queriam ser gay para a vida deles. Sua ambição. Era tudo de que falavam e eu queria mais do que ficar convivendo com tanta sujeira... mais do que aquilo.
O trabalho melhorou, consegui pequenos papéis em alguns filmes. Em 1986, participei do As Dunas de Sal. Ganhou todos os prêmios, mas não o público. Conheci Ruth trabalhando nele. Nós nos amamos. Fomos morar juntas. No dia dos namorados, ela me mandava rosas. Foram os três melhores anos da minha vida.
Em 1988, houve a guerra... depois disso não houve mais rosas. Pra ninguém.
Em 1992, depois que tomaram o poder, começaram a prender homossexuais. Levaram Ruth enquanto ela procurava comida.
Porque eles têm tanto medo de nós?
Queimaram Ruth com pontas de cigarro e forçaram a pobrezinha a dar nomes. Ela declarou que foi seduzida por mim.
Eu não a culpei.
Eu amava Ruth.
Não podia culpá-la.
Ela, porém... Ruth se matou. Ela não conseguiu viver depois de ceder aqueles últimos centímetros.
Oh, Ruth... Eles vieram me buscar. Disseram que todos os meus filmes seriam queimados. Rasparam meu cabelo, meteram minha cabeça numa privada e fizeram piadas sobre lésbicas.
Fui trazida pra cá e drogada. Não sinto mais minha língua e nem posso falar.
A outra lésbica daqui, Rita, morreu duas semanas atrás. Acho que vou morrer logo também.
Minha vida pode acabar neste lugar horrível, mas por três anos eu recebi rosas e não tive de prestar contas a ninguém.
Eu vou morrer aqui.
Cada centímetro de mim morrerá... exceto um.
Um só.
Ele é pequeno e frágil. É a única coisa no mundo que ainda vale a pena ter. Não se deve perder, vender ou entregar nunca. Não podemos deixar que alguém tire de nós.
Não sei quem você é, se é homem ou mulher. Talvez eu nunca veja você, nem te abrace, nem a gente beba juntos... mas eu te amo.
Espero que consiga fugir daqui. Espero que o mundo mude e as coisas melhorem. Que um dia as rosas voltem.
Queria poder te beijar.
Valerie.
"

[V for Vendetta, de Alan Moore e David Lloyd.
Capítulo 11 ¿ Valerie
Páginas 57 a 62 do volume 3.]

quinta-feira, 22 de junho de 2006

FLUXO DE CONSCIÊNCIA

"É engraçado como a maior parte das pessoas pode estar perto de alguém e gradualmente começar a amá-lo, mas jamais saber quando foi que isso aconteceu..."
(Tomates verdes fritos no café da Parada do Apito - Fannie Flagg)

Havia uma garota de cabelos compridos e tênis largos cuja aparência aparentemente não condizia com o seu "ser" cdf religioso.
Eu poderia seguir a vida sendo alguém indiferente ao mundo e às pessoas, assim, nunca gastaria mais que um minuto com alguém como a menina de calças largas.
Aconteceu que um dia eu me desafiei a olhar aquela garota nos olhos para então concluir que ela não passava de uma criança, me distraí por uns instantes, quando olhei novamente parecia muito mais adulta do que ela mesma gostaria.
Os dias demoram muito a passar. Mas assim que viram passado, no tempo psicológico, os dias se tornam milionésimos de segundo.
Tentar lembrar, com toda a intensidade cabível, cada dia que se viveu ao lado de alguém importante que está longe é quase como tentar assistir Evangelion sem se perder no enredo.
Havia uma garota ruiva que às vezes passava na minha frente durante o recreio. Se nossos destinos fossem guiados por nosso comodismo, eu nunca teria trocado uma palavra com ela.
Ela passava, eu a via, mas não a notava. Eu sequer poderia imaginar que um dia eu chegaria a conclusão de que entre todas as pessoas complexas que eu poderia conhecer, ela sempre estaria sobre o pedestal, com um faixa brilhante no ombro e uma flor amarela, medrosa, atrás da orelha .
Não me lembro qual era a tonalidade exata da tintura que usava para tingir os cabelos. Arrisco dizer que era algo como vermelho intenso. Intenso. Como um orgasmo: dizem que, por natureza, são eles curtos e intensos.
Eu poderia pinta-la em cores de Machado e dizer que tinha olhos de ressaca. Não, não eram oblíquos ou dissimulados. Eram olhos do tamanho do mundo e de todas as cores do arco-íris. E por serem de ressaca me arrastavam mar à dentro, para qualquer lugar.
Dói pensar que, por mais que os dois quarteirões que separam os prédios sejam só dois quarteirões, são eles como um abismo.
Havia um buraco negro à nossa porta. Olhávamos pra dentro dele e víamos nossos brilhantes futuros. Víamos o universo e, por mais que não costumássemos dançar, dançávamos através dele.
Nunca nos drogamos, nunca roubamos, nunca permitimos que a promiscuidade se aproximasse, nunca deixamos de estudar, passamos de ano no terceiro bimestre, passamos horas debatendo a física em um grampo de cabelo. Éramos perfeitos e invencíveis, mas um dia o telefone tocou e, com ele, a garota dos cabelos negros foi sugada pra dentro do buraco negro.
No início do mês confessei a uma amiga em comum o meu saudosismo. A resposta: "Ela escolheu se omitir e se submeter. Ela alega não ter escolha, mas se quisesse teria... Pra mim ela morreu."
Gostaria de ser comodista em momentos como este, e aceitar que pessoas prejudicam aos outros por sadismo gratuito enquanto outras procuram o caminho das pedras; Mas se fosse você o dono da história, abriria mão do seu melhor personagem? Deixaria morrer a sua heroína?
Ontem o meu melhor amigo fez dezoito anos e eu pensei: o tempo voou. Semana passada um velho conhecido contou-me que pessoas passadas iriam juntar. Seria crueldade satirizar? Assisti ao Ronaldo fazer dois gols, apesar de particularmente odiar futebol. Engordei seis quilos nos últimos meses. Meu médico sugeriu, na semana passada, que começasse a fazer exercício físico três vezes na semana para que até a época do vestibular eu tenha preparo físico e mente tranqüila. Está frio, minhas costas doem e eu prefiro comer pipoca tomando café enquanto reflito sobre como a metade do mundo consegue ser tão insuportável.
Uma garota da sala ao lado deixou de ir a aula faz uns três meses. Ela odiava noventa por cento de sua classe, talvez por isso escolheu perder o ano e se trancar em casa, a salvo do mundo.
Como será daqui a quinze dias, quando uma família Mulçumana inglesa for ao aeroporto receber o novo hóspede?
Faltam menos de seis meses para o vestibular e, se não for mexer com número, estudo vem depois de comer e dormir na lista de prioridades.
Eu a amaria pelo resto da vida se voltasse a pintar o cabelo de vermelho e aprendesse a ser só minha amiga.
Troquei o agudo por alguém que me ensinou a ter calma.

"A primeira vez que eu toquei não senti nada."
"Hã?"
"A sua mão. A segunda vez, fiquei um pouco...com nojo."
"De...desculpe. Não foi de propósito."
"A terceira vez, senti um calor. Através do macacão senti a sua temperatura. A quarta vez, eu fiquei feliz... Com a sua preocupação por mim."
[silêncio]
"Eu poderia tocar mais uma vez a sua mão?"
(Rei Ayanami - Neon Gênesis Evangelion #16)



Se não vale pedir pra ficar, posso ao menos dizer que sentirei imensa falta?

Guardarei a carta na garrafa. Guarde o fato de que conseguiu me fazer amar quando eu jurei que não amaria a mais ninguém.

quinta-feira, 25 de maio de 2006

Nascemos e, antes mesmo de fazê-lo, damos a alguém a chance de escolher um nome. Recebemos aquele nome. (Porque não um número?) E, então, já no nos primeiros mm³ de oxigênio que inalamos, somos impregnados pelo vício mantido por gerações e gerações de nossos antepassados. É a poluição, o excesso de CO2, a fumaça do cigarro, do carro, da indústria, da bomba atômica e o fedor do lixão.
Somos levados para casa. Recebemos um berço, uma primeira roupa, um primeiro sapatinho e um primeiro sorriso maternal. Com o tempo nos desenvolveremos, aprenderemos a falar, a ler, escrever. Aprendemos sobre o que é certo e o que é errado.
Menininho na porta indica que o banheiro é masculino e menininha de saia indica o feminino. Deve-se escrever, sempre, da esquerda para a direita. Devemos temer ao Deus Pai, Espírito e Santo acima de qualquer coisa. Meninas crescerão e serão mães. Se quiserem ter uma profissão, que sejam psicólogas, professoras, médicas, advogadas.
Meninos sejam bons pais e competentes engenheiros, políticos, soldados. Devemos pagar nossos impostos, estudar, crescer, constituir família, respeitar a lei do que é certo e o que é errado, nos assentar todos os domingos no sofá e assistir a algum programa nostálgico. Mas, antes disso, encarem quinze anos na escola e o fato de que é só mais um na multidão.
Sobretudo devemos aceitar que Deus criou a natureza e cabe a ele e somente a ele entender os mistérios dela. Devemos nos conformar com nossa falta de sorte. Aceitar que os opostos se atraem, catástrofes acontecem e ninguém é dono de seu próprio destino.
Porque isso? Oras, sempre foi assim. É como uma rotina, ou a cadeia natural dos fatos. São os seres humanos desenvolvendo a sensação ilusória de exercer poder sobre o caos.

O professor de matemática avançada sempre afirma que só uma contra-regra pode provar que não há uma regra. Talvez por isso sejamos criados para seguir a regra e não dar espaço a contra-regras. Criados? Por quem? Não importam os meios, importam os fins. Criados para ser pessoas normais. Nascidos para formar massa e conformar com o que quer que seja, afinal de contas, desgraça pouca é bobagem.
Bombeiros metralhados? Escolas ameaçadas de fechamento? A principal avenida da maior cidade do país vazia em plena luz do dia? Mais de oitenta mortes em um único fim de semana de dia das mães? Repito: desgraça pouca é bobagem.
Entramos em pânico. Assistimos à violência, cada vez mais próxima, sabendo que tudo seria evitado se não existissem jogos políticos, anos de eleição, copa do mundo e nacionalismo populista.

O bater de asas de uma borboleta pode causar um tufão do outro lado do mundo.

Se analisada pela ótica do senso comum, essa frase pode parecer catastrófica. Vale lembrar que o senso comum nada mais é que aquilo feito para que as pessoas aceitem sem contestar.
Hoje assisti a um filme sobre física quântica que apresentava essa mesma Teoria do Caos incompreendida de uma forma muito mais útil.
Você pode ter um pensamento positivo e descarta-lo ao se entregar ao pessimismo com o qual somos ensinados a viver. Da mesma forma, você pode entender que, aquele a quem personificam e chamam de Deus não é só o criador, mas também a criação; e que se nós somos a criação, somos também deuses em criação. E depende de nós, e somente de nós, desenvolver o poder de mudar o mundo.
Um pensamento positivo pode ser só mais um com destino ao cemitério dos pensamentos sufocados pelo determinismo. Mas, um pensamento positivo, pode ser o bater de asas da borboleta. A coisa que, a princípio é tão pequena que a seu primeiro impulso é descartar logo e evitar o ridículo, mas que se levada adiante pode ser tornar uma idéia. E uma idéia pode ser a boa idéia precisa para mudar o mundo.


O nome do filme é ¿Quem somos nós?¿. É exibido no Belas Artes.

Você pode assisti-lo como se assistisse a mais um documentário. Mas você pode assisti-lo, absorvê-lo e se perguntar:
Até que ponto do buraco você quer ir?

sábado, 6 de maio de 2006

A Petrobrás constrói um gasoduto da Bolívia ao sul do Brasil e de repente surge uma nova febre: Total Flex que nada, todos querem abastecer seus carros com o gás natural boliviano. E os bilhões de reais gastos? Um excelente investimento.
Pois eis que surge um Índio-Presidente-Índio boliviano e diz "Ei! O gás é nosso" e poft! O Brasil vira de cabeça para baixo.
E que venham várias aulas sobre o assunto, afinal de contas, tudo antes do meio do ano cai na Federal. É geografia, economia geopolítica. História. E, modo corriqueiro do Junio História de tratar o assunto à parte; se fossemos os Eua, a essa hora Evo Moraes já estaria sendo mandado para a prisão da base militar Americana em Cuba, onde ficam todos os prisioneiros da pior espécie.
Não somos. E como Lula alegará que não tem dedo suficiente e não fará nada, que dentre alguns meses venham os Ianques às nossas fronteiras!

Lembro. Tinha meus catorze anos quando os Eua invadiram o Iraque. Quase morri de preocupação. Liguei para o cara que namorava na época, Diogo, e nas duas horas seguintes ele tentou me convencer de que aquilo não renderia uma 3ªGuerra Mundial e mesmo que rendesse, ele e meu irmão não seriam recrutados.

Pois eis que surge o próximo da lista do Bush após o Irã.
Talvez eu devesse ligar novamente para o Diogo e dizer que dessa vez não vai só ele e meu irmão, mas o Lázaro, o Felipe e o Salgado também.
Pensando bem, ligar pra ele seria meio complicado já que a última notícia que tive de Diogo foi que se mudou para a Escócia para morar com o Pai. Talvez nesse momento ele esteja ensinando às escocesas a dançar axé, alheio às medidas malucas do Índio Coqueiro.

Não. Não ria de mim. São medos tolos. Apenas meus medos tolos.

Vê. Hoje eu não estou me descabelando. Assisto a tudo com uma frieza débil. Talvez eu devesse opinar. Talvez eu devesse pregar que se legalizassem a Coca, o problema econômico com a Bolívia se resolveria. E talvez quanto, o Irã não esteja brincando com fogo e tenha alguma carta pior que Bomba atômica na manga.

Ainda não vi Duendes, mas: "Se fosse para viajar, qual seria o seu maior medo nessa história toda?"

Se fosse para viajar... eu lembraria do filme. Aquele, muito bom. V de Vingança. Ou como diria a antipática da Veja: "B de Bobagem". Bobagem nada.
E se no meio desse mundo de cabeça pra baixo o não sei o que Macedo dono daquele castelo na Av. Olegário Maciel - com direito à quarto de Luxo para Pastor e dizimo parcelado - resolvesse dar um golpe de estado e recriasse o Fascismo acrescentando-lhe um quê moderno.
A quem ele perseguiria?
Primeiro aos freqüentadores do Matriz, que entram em sua Ilustre Igreja só para usar o banheiro.
Segundo aos vendedores de Vinho barato, que lucram com os freqüentadores do Matriz que ao encherem a cara enchem também a bexiga e por isso - pelo álcool e pela bexiga - entram na igreja só para usar o banheiro.
Depois perseguiria a todos aqueles curiosos impertinentes que vão à Seção do Descarrego só para se divertir. E, finalmente, declararia a caça à Liberdade. À todos que pregam a liberdade. E nessa provavelmente iria eu e você. Já que alguém que não acredita em "liberdade" a muito desistiu de ler esse blog. E acredite! Ele poderia nos proibir de usar saia!

[...]

E enquanto o mundo acaba aqui estou, escrevendo superficialmente sobre tudo enquanto escuto a música que sai da caixa de som ir variando. Começa com Björk e ao fim do Shhh muda para Garbage e uma vontade enorme de dançar toma conta. Contenha-se! Dançar só imitando Chamon. E toca MopTop. Los Hermanos. Strokes. Então toca Hardcore. Cacá deixará um comentário indignado ao saber que eu continuo ouvindo Finch, banda que seria melhor entendida como Emocore... Enfim Placebo.
Penso:
Eu não sou nada mais que uma contradição. Alguém que vive zoando emos, mas ouve uma banda de Emocore.

Talvez eu só esteja traumatizada. Talvez eu só seja como um Pierrot, the Clown.

segunda-feira, 1 de maio de 2006

Certa vez ouvi alguém dizer que coincidências não acontecem.
Lembro da primeira vez que a vi. Era uma criança. Sim, uma criança que queria ser adulta. As garotas que me acompanhavam naquela tarde de abril apertaram-lhe as bochechas e disseram que ela ficaria muito bonita quando crescesse. Sim, ela ficaria.
Tinha menos que treze anos na época, como disse, era uma criança. Eu tinha pouco mais que meus quinze. Creio que tudo aconteceu na mesma época em que comecei a publicar textos por aqui. Era uma garota nerd que havia acabado de ser aprovada no Cefet no meio de um bando de garotas espalhafatosas. Ela era a menina que me olhava de modo estranho e talvez desejasse ficar grande logo e se tornar alguém bem menos nerd, certinho e quadrado que eu.
Depois de três semanas nunca mais a vi e tão ocupada eu estava, com a minha vida, que estaria mentindo se dissesse que sequer pensei que nunca mais a veria.
Um ano depois, o meu mundo já havia caído, eu me encontrava na rua de uma amiga a acompanhando até a casa de uma garota de poucos neurônios. Chegamos, assentamo-nos na cama da garota. Havia mais gente lá. Em boa parte gente conhecida. Me ofereceram um cigarro que eu recusei explicando que não fumava. Alguém fez um comentário sobre esse meu eu politicamente correto. Elogiaram a minha bermuda e o meu cinto de rebites. Havia uma garota deitada no colo de uma garota conhecida. Seu rosto me lembrava alguém.
Reclamávamos de nossas vidas. Perguntaram-me sobre o namoro. Contei sobre as catástrofes. Compartilhávamos nossas infantis experiências enquanto eu segurava os espirros em meio aquela fumaça. E aquela garota que me lembrava alguém.
Foi quando lembrei. Perguntei se era ela mesma. Ela disse que também lembrava de mim e admitiu estar surpresa com o meu posicionamento a cerca do assunto vigente. Disse que nunca pensaria que aquela nerd que ela conhecera poderia ser alguém como eu.
Há um ano atrás, naquela mesma tarde, soube que ela namorava um cara que era como o príncipe encantado num cavalo branco no meio de um sonho cor de rosa. Ele cuidava dela e era o melhor que ela poderia querer. Não a posso censurar por esta pequena ilusão. Eu também possuía sonhos bastante quiméricos naquela tarde. Sonhos em que ao me tornar maior de idade tentaria engenharia em Campinas e iria juntar-me a alguém. Sonhos que não são mais sonhados.
Ironicamente ela estava comigo no show em que meus sonhos foram por água a baixo. Estava comigo, porém indiferente já que obviamente ela sumiria da minha vida nas semanas seguintes por uma segunda vez.
Coincidências não acontecem. Assim pode-se afirmar que uma pessoa aparecer em sua vida por uma terceira vez não é coisa do acaso. Pois ela voltou. Em uma tarde em que eu sofria por alguém nos encontramos. Ironicamente sofríamos da mesma síndrome. Ela me contava que seu príncipe encantado agora brincava de tempo. E que ela estava cansada disso. Ela tomou sua decisão e inspirada nela tomei a minha. E quando dei por mim, ela queria me ver e eu queria vê-la. Ela queria me levar para sair e eu a levei para sair comigo.
Não me perco mais pensando no que poderia ter sido depois daquela terça feira 27 de Dezembro. Lembro-me das palavras que disse a ela, uma semana depois, quando ela disse que o príncipe encantado estava de volta, mas que ela não queria que eu fosse embora.
De uma forma ou de outra não fui. E hoje me preocupo com ela tanto quanto uma irmã se preocupa com a sua caçula. Às vezes eu até falo tanto em sua cabeça quanto uma irmã mais velha faria. Mas é que o príncipe encantado virou o autêntico lobo mau e só ela parece não perceber.
E desde que um conto de fadas se virou em outro, João e o pé de feijão plantou uma sementinha mágica de coca e fez crescer uma torre de babel. E não vou dizer se ele encontrou ou não um gigante lá em cima já que duvido que ela tenha sequer chegado ao topo...
Houve uma época em que acreditava que coincidências aconteciam. Naquela época eu sonhava que o tempo passasse logo enquanto esperava um ônibus chegar não para tomá-lo. Hoje eu espero que um ônibus diferente chegue enquanto sonho que Babilônia deixe de ser babilônia.

segunda-feira, 17 de abril de 2006

O silêncio? Não preciso ver o filme pra saber.
O silêncio, ela sabe, o silêncio fala por nós.

domingo, 19 de março de 2006

Sobre o novo nome do Blog.

Há com toda espécie de sucesso ou realização certa suscetibilidade a estar exposto. Depois de uma crônica publicada em um jornal e a bajulação da família inteira, chega uma moda de ligarem para parentes e amigos que moram fora do estado Minas Gerais e dizer para que digitassem meu nome completo no Google e procurassem nos resultados o dito texto. O que se encontrava ao fazê-lo? Alguns links com a lista dos aprovados no Cefet em 2004, naturalmente o link para a crônica e, de brinde, o link blog.
Pode-se pensar nisso como uma coisa positiva se escolher um ponto referencial diferente do meu. O motivo pelo qual isso é, para mim, um problema: Como diz sempre minha mãe - ¿Devemos sempre nos preservar.¿
Não que eu não queira que meus textos sejam lidos. Se eu não o quisesse os escreveria em um diário e não aqui. Fato é que escrevo, não só para os amigos, mas para quem me desconhece. Não para quem pensa que me conhece.
Sobre o novo nome do blog, segundo o Aurélio:
Ritmo: [Do gr. rhytmós, 'movimento regrado e medido', pelo lat. rhytmu.]
S. m.
1. Movimento ou ruído que se repete, no tempo, a intervalos regulares, com acentos fortes e fracos.
2. No curso de qualquer processo, variação que ocorre periodicamente de forma regula:.
3. Sucessão de movimentos ou situações que, embora não se processem com regularidade absoluta, constituem um conjunto fluente e homogêneo no tempo.
4. Nas artes, na literatura, no cinema, etc., a disposição ou o desenvolvimento harmonioso, no espaço e/ou no tempo, de elementos expressivos e estéticos, com alternância de valores de diferente intensidade.
5. Arte Poét. Num verso ou num poema, a distribuição de sons de modo que estes se repitam a intervalos regulares, ou a espaços sensíveis quanto à duração e à acentuação.
6. Mús. Agrupamento de valores de tempo combinados de maneira que marquem com regularidade uma sucessão de sons fortes e fracos, de maior ou menor duração, conferindo a cada trecho características especiais.
7. Mús. A marcação de tempo própria de cada forma musical.
8. Mús. O conjunto de instrumentos de percussão e outros similares que marcam o ritmo (6) na música popular; bateria.
9. Bras. O conjunto de ritmistas [ v. ritmista (1 e 2)] .

Dissoluto: [Do lat. dissolutu.]
Adj.
1. Dissolvido, desfeito.
2. Devasso, corruto.



Tirem suas próprias conclusões.

terça-feira, 14 de março de 2006

Não concordo com tudo o que você possa dizer ou argumentar, mas sinto-me disposta a defender o seu direito de pensar da forma que achar cabível.
Sobre concordar? Não. Não. Não mesmo!
Porque três vezes não? Pelo ato da repetição. Pra enfatizar. Ou seja lá como preferir.
Ok. Não vou mais justificar nada. Mesmo porque presumo que minhas justificativas pra você sejam tão falhas quanto as suas pra mim. Não rendamos mais o assunto. Não vale a pena. Mesmo porque desde os doze anos que eu já não brigo com ninguém por um motivo idiota - como essa epopéia no fim das contas me parece - e demoro dois anos pra descobrir que não vale a pena. Nós já sabemos que não vale. Então torne toda essa história relevante como eu tenho feito e não mais vire o rosto ou venha com as sete pedras afiadas e pontudas(como diz o professor de física: "O sonho dessas pontas é atrair os raios nervosos!"). Sobre brincadeiras mal compreendidas: Diga a todos que percam o medo de serem repreendidos e, caso consigam, me ensinem, por favor.
E ainda, sobre o dois em um. A glicose em excesso. E qualquer que seja o próximo item da lista...
"Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria."

Agora me dê licença. Tenho uma carta vermelha a escrever. E você bem sabe como sou: boa em textos, mas péssima em cartas. Afinal de contas ninguém nasce perfeito.





...e provavelmente ela continua sendo mais sentimental que eu.

terça-feira, 14 de fevereiro de 2006

Tudo está de novo como era antes, tudo está confuso. Mas esta confusão* é só o que eu demais poderia desejar neste instante.

Segundo Heráclito ¿Tudo está em mudança e nada permanece parado.¿

Comecei o último fim de semana decidida a pensar bastante e tentar resolver entre uns e outros. Mas há dias em que de repente algo toma um lugar de destaque e não se consegue pensar em mais nada.
É quando alguém até então desimportante ganha seu papel.
É quando toda a mágica do começo... do novo... do simples ¿estar gostando¿ de alguém começa... E é quando tudo volta ao que era antes. E tudo está confuso.
Mas eu não posso negar que era tudo o que eu podia querer.

sábado, 11 de fevereiro de 2006

Pequeno e frágil e ponto.
Complexo, onde complexidade é um motivo de atração. Difícil. Não difuso. Não prolixo. Não tudo o mais. Parece puro e límpido, mas desesperadamente intocável, improvável, inalcançável e todos os "ins" mais. Observa-se. Pensa-se sobre. Desespera-se. Indaga-se. E nunca saberá o que mais há para se fazer.
Julga-se validável.
Mas sabe-se lá...


O poema não tem a ver com esse post mínimo. É um poema que recitei a alguém hoje. Eu e a minha mania de recitar poemas a pessoas que não os entenderão. Pobres dos poetas incompreendidos.


Quase
[Mário de Sá Carneiro]

Um pouco mais de sol - eu era brasa.
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...

Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num baixo mar enganador d'espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...

Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!

De tudo houve um começo... e tudo errou...
- Ai a dor de ser-quase, dor sem fim... -
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se elançou mas não voou...

Momentos de alma que desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...

Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...

Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...

...........................................
...........................................

Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...



Repetindo o feito do último post falo um pouco do Poeta, já que suspeito que poucos o conhecerão. Gosto do Pessoa. Fernando Pessoa. Aquele cara que criou três personagens (Heterônimos) com idéias e vidas diferentes e que tinham cada um seu estilo. O meu predileto é o Álvaro Campos (Sim, o pessimista). Pois nas minhas leituras de poemas do Pessoa acabei me deparando com um Modernista Português ¿colega de guerra¿ dele. Eis Mário de Sá Carneiro.



Não muito mais o que escrever por hora. Em breve quem sabe, outra primavera nasça por aí. Por hora resumo-me a isto e nada mais.


Terça Feira, Estado de Minas, Caderno D+, última página: A Crônica do dia 11.01. Ignorem a foto, por favor.

sábado, 4 de fevereiro de 2006

Em dado momento o Rei Vermelho pergunta a Alice: "O que você está vendo?", e Alice responde: "Nada". O Rei impressionadíssimo, comenta: "Mas que ótimos olhos você tem!"

Sinto-me uma cega perante Alice em dias como os últimos.
De repente a melancolia. Aquela mesma que usualmente me atira às lembranças mais dolorosas. Às saudades.
E com ela a insônia. E esta não por excesso de cafeína ou por haver mais o que fazer durante a noite; ocorre simplesmente porque de repente dormir parece incabível.

Dormir. Sonhar, quem sabe.

Mas sonhar parece indigno demais.
E o amanhã parece demoradamente não tardar. E tudo ainda é tão melancólico: O despertador que toca importunamente fazendo tudo parecer cedo demais. O banho. A aurora. O café fervendo. A cor das listras do par de meias que vá se calçar. O ônibus que demoro um pouco a passar. E como o nível de cafeína não parece elevado o suficiente a visão de algo tolo como o banco defronte a porta da sala de aula parece de repente excessivamente apropriada.
É só um querer ser deixado em paz no canto do banco para poder observar e somente observar que até discutir com algum ¿chato oficial¿ perde o seu encanto. As piadas, todas elas perdem o seu encanto. A aula de Matemática, ela perde seu encanto. Qualquer intervalo entre aulas perde o seu encanto. E de repente lá estou assentada no tal do banco observando pessoas passarem quando alguém me resgata daquilo: "Que cena emo!" Emo? Só queria passar o dia todo num banco como aquele assistindo à vida. Por quê? Por quê? Pra quê?
Eu e a minha disparatada mania de observar as pessoas. Analisa-las enquanto me pergunto incansavelmente: O que há por trás daqueles rostos? O que pensam? O que sentem? O que as leva a agir dessa forma? Alcançam assim algo que se possa chamar felicidade?

- Oh! Sim! Amanhã virei com um arco vermelho de bolinhas brancas na cabeça, aliás ele combinaria perfeitamente com meus óculos.
- ... você poderia usar também uma porção de coisas xadrez.
- ... Xadrez? - Julia olha para os tênis. - Já estou quase lá, Ah?

E de repente qualquer rótulo parece indevido. E o que é o vício de rotular a tudo o que se pode senão a ignorância do que se trata?
Seguir tendências parece frívolo. Mas deixando de lado tudo aquilo que é só parecer pergunto-me o que é o ser? No meio de tantas pessoas quem realmente é o que? As pessoas que se apegam aos rótulos e ao parecer entendem o que significa o ser? Usando de um exemplo típico: Pessoas que seguem a moda de beijar outras do mesmo sexo entendem o que leva àquilo ou só realmente um homossexual é capaz de entender o que - excluindo todo o mundo de cores que cantam a diversidade, excluindo todo o mais - é "ser gay"?
Presumiria que sim. Assim como, usando característica mais bem aceitas na sociedade como exemplo, os Românticos parecem tolos e errôneos aos Frígidos e só os românticos parecem capazes de realmente entender o que é ser romântico.

Já voltando à Alice. Penso se não é um erro tentar sempre enxergar o que há além. Pergunto-me se não é um erro imperdoável perder meu tempo em um dia melancólico observando as pessoas e historiando e fantasiando sobre suas possíveis vidas.
Talvez por mais que tentemos entender o que há além a verdade seja que não há nada para entender.

Lembro-me agora de uma escritora Ucrânia, naturalizada brasileira de que gosto muito. Sua escrita é tão boa, que não gastarei as minhas próprias palavras explicando porque admirá-la. Tomarei emprestadas as dela mesma: "Mas já que se há de escrever, que ao menos não se esmaguem com palavras as entrelinhas. O melhor ainda não foi escrito. O melhor está nas entrelinhas." (Clarice Lispector) Venho cita-la agora não para aproveitar da já feita citação, mas de uma outra frase em específico que li, se não me engano, em um livro dela chamado Laços de Família. Concluo o meu dia de melancolia, bancos e pensamentos com ele:

"Não se preocupe em entender'. Viver ultrapassa todo entendimento."

quarta-feira, 11 de janeiro de 2006

Eu sou só mais uma menininha excêntrica no mundo e você?
Eu nunca pintei o cabelo e não tenho tatuagens, mas eu queria um piercing no queixo.
Eu já participei de manifestações de esquerda no meio da Afonso Pena. Já me declarei anarquista. Já quis votar aos catorze anos e tentar mudar o mundo. Sobretudo, quando pude tirar o título de eleitor eu declarei que odeio política. Eu nunca votei.
Eu não vou me alistar no exército, mas pretendo fazer uma tatuagem assim que fizer 18 anos e passar no vestibular.
E=mC² um dia vai estar gravado em minha pele.
Eu amo ler, principalmente livros estranhos. Eu adoro o modernismo, o machadismo, o dadaísmo. Nada é mais mágico que o fluxo de consciência e o feminismo! Vivo dualistamente como uma forma de exercer algum tipo de realismo. Adoro a anti-arte, o protesto mudo. As revoluções me atraem.
As letras são como a razão da minha vida.
Mas os números... eu sei que eles explicam a razão do universo.
As letras me embalam em um romantismo profundo... Os números me injetam razão e me prendem ao juízo doentio.
Eu tomo muito café e perco o sono. Reclamo das olheiras, mas eu não deixaria de tomar café por elas.
É uma manifestação comodista. Mas esse tipo de manifestação é ubíquo.
Eu sempre achei que era o tipo de pessoa que nunca perigaria tomar bombas. Sobretudo eu quase o consegui, tendo uma desistência forçada quase na linha de chegada. E na hora H, eu respirei livros e passei direto.
Não. Eu não sou exatamente uma mocinha metida a sabe-tudo. Arrogância ambulante. Cheiradora de pó de livro.
Eu me chamaria de Nerd se isso agora não me parecesse um clichê. Apesar de tudo, correndo o risco de parecer presunçosa, eu possuo inteligência.
Eu só ainda não encontrei alguém que me desafiasse. Ou algo que me jogasse contra a parede e dissesse: mostre do que é capaz. Talvez eu passe o resto da vida esperando isso.
Eu passei toda a minha pré-adolescencia brigando com minha irmã mais velha por ela ser contra pessoas que usam all star. Sobretudo, eu continuo usando all star.
E eu não gosto de praia. Eu não gosto de sol. Mas eu amo o vento vindo do mar.
Eu odeio animais, mas tenho um peixe de estimação. O nome dele é peixe. E eu vejo nele o meu pecado de sempre tentar dar o nome óbvio às coisas. Amizade, amizade. Saudade, saudade. Esperança, esperança. Indiferença, indiferença. Amor, amor.
Eu sou como a criança assentada no parapeito da janela de seu quarto a noite toda, esperando que apareça uma sininho que a permita voar em busca da terra do nunca.
Eu sou uma garota que crê nas possibilidades a quem um cara disse que daqui um tempo perceberá que seus braços tem um tamanho limitado, e que a certas coisas não alcançará.
E que você pode sempre tentar se aproximar mais antes de esticar os braços. Mas a cera das asas derrete quando se chega próximo demais ao sol.
Mas eu sei, sem saber que era impossível alguém foi lá e fez.
Então eu sou só alguém que pede que nunca lhe digam que algo é impossível. Porque quando realmente se quer algo, o mundo se moverá em favor. E por mais que os braços possam ter um tamanho limitado: quem foi que disse que eu não possa transformar a pele e os ossos em plástico e borracha?
A engenharia Química está aí. O futuro nos chega sorrateiro à soleira da porta. E nada é o que parece.
Se as rosas tem espinhos...
E a terra é redonda e azul...
Se o universo tem fim...
Se os átomos são divisíveis...
Se a física moderna tem mesmo razão...
Não se deve, então, subjugar um livro pela capa.
E se não houver tempo para avaliar, deve-se então se entregar ao desconhecido sem medo de o abismo ter fim.
Porque se for pra avaliar pela forma:
Eu sou só mais uma menininha excêntrica no mundo.

sábado, 7 de janeiro de 2006

Ausência

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces.
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada.
Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.


Vinícius de Moraes

Mandei isso pra uma amiga. Ela tem problemas similares ao meu. Ela anda cercada pelas reticências da vida que não a deixam descobrir o que se deve fazer para seguir adiante. E ela continua apenas seguindo em frente, e me arrasta com ela. E ela chorou ao ler isso. E eu teria chorado. Se eu não viesse me tornando uma pessoa tão hipocritamente fria...


E ela é mais sentimental que eu...

terça-feira, 3 de janeiro de 2006

Eu me pergunto porque as pessoas continuam festejando a chegada de um ano novo mesmo sabendo que ele só será mais um ano.
Eu me pergunto, mas não encontro respostas. Eu sou só uma pessoa que não acha respostas pra nada.
Talvez o motivo seja o mesmo pelo qual a todas as manhãs caminhamos à janela pra ver o sol recém nascido. Nós sabemos que ele nasceu, pois ele sempre insiste em nascer. Sobretudo nós vamos lá, abrimos a cortina e conferimos que tudo continua no lugar.
E parece irônico pensar que mesmo que tudo não esteja no lugar, ele continua nascendo.
E eu não deveria supor nada. Eu não deveria buscar "talvezes" para justificar as coisas. Eu não deveria, mas talvez possa me comparar ao sol. Talvez tudo esteja fora do lugar e como tudo é nada, eu não deveria renascer. Mas eu sou uma ironia. E eu continuo aqui.
Me pergunto também o porque desse vício de fazer promessas de ano novo. Só vejo isso como uma forma de tornar tudo mais difícil. Uma forma de prolongar a esperança moribunda. Porque não fazemos promessas de Dia Novo? Porque não comemoramos a chegada de cada dia? Pois o ¿dia após dia¿ sim é um motivo de comemorações. É ele quem nos leva vida em frente, mesmo quando não temos mais forças para isso. É ele que nos guia eternamente e nunca irá nos abandonar. E é só ele a quem julgo capaz de me compreender, já que ele e eu partilhamos desse Dualismo tão eminente. E da mesma forma como ele pode ser o remédio para todas as dores e o veneno que provocará as mesmas, eu sou só alguém absurdamente estranho e ao mesmo tempo tão normal.


Constatei hoje -
não sem certo prazer - que
Como todos os "a-normais",
sou diferente
Incômoda,
indispensável.


[No Espelho, Maria Maroca]