Lembro do que disse
naquela manhã de quarta-feira de carnaval. Era sobre resolver
primeiro o que era velho, para só então arriscar-se a viver o novo.
Ai de mim, que o novo era tão límpido e parecia um pecado absurdo
deixá-lo enviesar-se em meio às coisas inconcluídas e insolúveis.
Lembro da sensação
que só o novo sabe causar: a quebra da rotina e a inclusão de novos
procedimentos tolos feito sempre olhar pro fim do corredor só pra
ocasionalmente sentir a gravidade parar de agir no estômago por
alguns segundos, enquanto os joelhos bambeiam ligeiramente e a cabeça
se esquece que os pulmões precisam de ar. Guardo
sobretudo o gosto, doce, e a sensação de tanto a dizer para tão
escasso dicionário.
O tentar encontrar as
benditas palavras, um quiproquó. Disse tudo o que pude, ouvi tudo o
que ela se permitiu, mas eram sempre as palavras erradas. Como não
havia contorno, me calei. Me calei e ela se calou. E agora quando
palavras se fazem necessárias nos calamos juntas, por minutos
corridos e repetidas vezes. O quanto for necessário. Como se não
houvesse nada a dizer. Como se nos educássemos ao silêncio.
Resolvi tudo. Vivi tudo
que havia pendente ao viver. E agora o meu romance novo ficou velho.
Talvez por este ter
começado num abraço de despedida, ou pelas palavras inalcançadas
(ou inalcançáveis), mas não morre a sensação de que eu
“sou, e talvez serei
sempre, o da mansarda,
Ainda que não more
nela;
Serei sempre o
que não nasceu para isso;
Serei sempre só o que tinha qualidades;
Serei sempre o que
esperou que lhe abrissem a porta ao pé de uma parede sem porta”
Não existe porta.
Então decidi viver o novo enquanto o novo velho supura.
E o que nos resta são
abraços de despedida sequenciados quase harmonicamente, onde a cada um, por alguns segundos, eu me
encontro e me perco nela.